sábado, 28 de julho de 2012

Ney canta Cartola

Cartola. Negro. Pobre. Semi-analfabeto. Compositor. Sambista. Homem. Marido de Dona Zica. Mangueirense. Mestre.
Ney Matogrosso. Homossexual. Seco e Molhado. Do rock ao clássico. Intéprete.
A fusão de dois ícones da música, da letra, da harmonia. O encontro de duas pessoas cujos perfis causam calafrio no espectro preconceituoso. O negro e o homossexual. O cantor de cara pintada e o pobre. Secos e Molhados e a Mangueira. A vertente do rock nacional entra na avenida. É batuque com rock.
Viajo nestas linhas ao som do CD Ney Matogrosso interpreta Cartola. Já escutei as faixas "O Sol Nascerá", "Sim", "Cordas de Aço", "Corra e Olhe o Céu".
Brasil. Brasileiros. Pais. Professores. Acadêmicos. Teóricos. Burocráticos. Apresentem Cartola aos seus filhos, alunos e discípulos. Cartola. O negro. O pobre. O humilde músico da Mangueira e da Dona Zica. Ele mal completou o antigo curso primário. Cartola. Superior. Diplomado pela Vida.
[pausa] Agora toca "As Rosas Não Falam".
Segue a canção. A obra. Cartola era poeta da intimidade da vida. Leves acordes, algumas frases e mais uma composição. Ele, sim, falava pelas rosas para nós. Eu sinto o perfume das rosas ao escutar essa canção. Lembro-me da primeira vez em que a escutei. Na voz de Beth Carvalho (mulher, sambista, mangueirense e cartolense). Eu estava com meus oito anos. Mal imaginava o quanto o autor da obra entraria em minha vida e me encantaria com a sua arte.
Cartola foi descoberto tardiamente, mas não a ponto de que não pudéssemos eternizá-lo. Por muito tempo, mesmo após certo reconhecimento, foi visto lavando carros, em uma rua de uma cidade fluminense (a qual não sei o nome).
Cartola. O primário. Para provar que incluir "universitário" na sequência de qualquer modismo é inócuo. Que Cartola, que o samba, que a boa música nunca sejam universitárias. Melhor primárias. Simples. Feito Cartola.
O Mundo é um Moinho...

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